sexta-feira, 30 de dezembro de 2011

Militares criticam lista de acusados de tortura

Biblioteca Nacional vai publicar nomes


Associações de militares criticaram a publicação, por parte de revista ligada à Biblioteca Nacional, de lista de 233 militares e policiais que supostamente torturaram presos durante o governo Ernesto Geisel (1974-1979).

A informação foi publicada ontem na coluna Mônica Bergamo. A lista, que faz parte de acervo de Luís Carlos Prestes (1898-1989), estará na edição de janeiro da "Revista de História da Biblioteca Nacional", editada pela Sociedade de Amigos da Biblioteca Nacional.

"[A publicação] Não deixa dúvida de que lado está o órgão público", disse o vice-presidente do Clube Militar, general Clóvis Bandeira.

"Isso cria uma situação de conflito gratuito, que já deveríamos ter superado há muito tempo", disse o presidente da Associação dos Oficiais Militares Estaduais do Brasil, coronel Abelmídio Sá Ribas.

Segundo o editor da revista, Luciano Figueiredo, os documentos de Prestes serão doados ao Arquivo Nacional, o que os tornará públicos.

domingo, 18 de dezembro de 2011

SP também terá sua Comissão da Verdade

Assembleia investigará crimes da ditadura militar no Estado e vai fornecer informações a órgão do governo federal.

Deputados estaduais vão apurar torturas e mortes de 1964 a 1982 e planejam iniciar em março as investigações


A Assembleia Legislativa de São Paulo criou um grupo para investigar os crimes da ditadura militar no Estado e fornecer informações à Comissão Nacional da Verdade.

A comissão será composta por cinco deputados estaduais e terá dois anos para apresentar um relatório sobre casos de torturas, mortes e desaparecimentos de militantes que se opuseram ao regime.

Devem ser convocados a depor ex-presos políticos e agentes que atuaram em órgãos da repressão, como a Oban (Operação Bandeirante) e o Dops (Departamento de Ordem Política e Social).

Além de elucidar crimes, o grupo tentará identificar seus responsáveis, segundo o projeto apresentado pelo deputado Adriano Diogo (PT) e aprovado por acordo de líderes na noite de quarta-feira.

"A comissão não terá sentido de vingança ou revanche. Queremos saber como morreram os desaparecidos e responder perguntas que o Estado nunca respondeu oficialmente", disse o petista, que militou na ALN (Ação Libertadora Nacional) e ficou preso entre 1972 e 1973.

A exemplo da comissão nacional, a estadual não terá poder para julgar suspeitos de violação de direitos humanos. Mas vai encaminhar suas conclusões ao Ministério Público, que poderá entrar com novas ações na Justiça.

Outro objetivo do grupo é apoiar as buscas pela identificação de ossadas de vítimas do regime enterradas clandestinamente em cemitérios da capital paulista, como os de Vila Formosa e Perus.

O texto aprovado na Assembleia reproduz diversos artigos da lei federal sancionada há um mês pela presidente Dilma Rousseff.

Uma das poucas diferenças está na composição dos grupos. Enquanto a comissão nacional será integrada por sete representantes da sociedade civil, indicados pelo Planalto, a paulista terá cinco deputados estaduais, escolhidos pelo presidente da Casa.

A tendência é que o órgão reproduza a correlação de forças na Assembleia, onde o governo Geraldo Alckmin (PSDB) tem ampla maioria.

MUDANÇA

Por pressão dos tucanos, Diogo aceitou limitar o período a ser investigado pela comissão. O texto original previa a apuração de crimes cometidos ao longo de toda a ditadura (1964 a 1985).

A data final foi alterada para 1982 -o que exclui o governo de Franco Montoro, fundador do PSDB e um dos líderes da campanha das Diretas.

Segundo Diogo, isso não prejudicará os trabalhos, já que a gestão de Montoro respeitou os direitos humanos.

Assembleias de outros Estados, como Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul, devem votar propostas semelhantes em 2012. (Bernardo Mello Franco)

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sexta-feira, 16 de dezembro de 2011

Familiares voltam a cobrar mais empenho na apuração de crimes

Familiares de mortos e desaparecidos voltaram a cobrar maior empenho na apuração das violações de direitos humanos ocorridas no episódio da guerrilha do Araguaia, há 28 anos. Em nota distribuída ontem, lembraram que já se passou um ano desde que a Corte Interamericana de Direitos Humanos preferiu a sentença condenando o Estado brasileiro pelo desaparecimento de 70 pessoas envolvidas na guerrilha, pela ausência de procedimentos para o estabelecimento da verdade e pela permanência da impunidade dos crimes.

O primeiro aniversário da sentença foi lembrado em nota assinada pelo Centro pela Justiça e o Direito Internacional (Cejil), o Grupo Tortura Nunca Mais do Rio de Janeiro (GTNM/RJ) e a Comissão de Familiares de Mortos e Desaparecidos Políticos, O texto enfatiza sobretudo a falta de diligência para apontar e punir os responsáveis pelas violações que teriam ocorrido.

"Reconhecemos que alguns passos foram dados", diz a nota, referindo-se à Comissão Nacional da Verdade, entre outras coisas. Logo em seguida, porém, afirma que a comissão não substitui a obrigação do Estado de estabelecer processos judiciais, como determinado pela corte.

No fundo, a nota volta a por em cena o impasse que existe entre a corte vinculada à OEA e a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), de 2010, definindo que a Lei de Anistia de 1979 se estende também a agentes de Estado acusados de crimes contra os direitos humanos. (O Estado)

quarta-feira, 14 de dezembro de 2011

30 anos de El Mozote: A maldição de Marcos Diaz



Este texto foi publicado originalmente na versao impressao do jornal Brasil de Fato em junho do ano passado. Publicado aqui hoje por ocasiao do aniversário de 30 anos da tragédia.


O episódio ocorrido em El Mozote, em El Salvador, em 11 de dezembro de 1981, é um dos maiores massacres cometidos contra civis na história recente da América Latina, com pelo menos o dobro de vitimas que My Lay e quiçá levado a cabo com mais requintes de crueldade do que o da vergonha mundialmente famosa promovida na aldeia vietnamita pelos Estados Unidos durante a guerra, nos anos 60.

O famigerado ex-batalhão Atlacatl do exército salvadorenho, numa tentativa desesperada de conter o brote revolucionário no país no inicio dos anos 80, aterrorizou e assassinou quase 1200 civis pacíficos, incluindo idosos, mulheres e crianças de colo. A missão do Atlacatl, financiado e treinado pelos Estados Unidos, era colocar em prática as medidas necessárias para operações conhecidas como tierra arrasada ou, no jargão do próprio exército na época “secar o rio para evitar que os peixes cresçam”.

Contudo, para muitos salvadorenhos, especialmente os da geração pós-guerra (1980-1992), El Mozote é distante, no tempo e também no espaço, apesar do cenário da matança estar a menos de 300 km da capital, San Salvador.

Essa é a ironia da recente e obscura história salvadorenha. El pulgarcito de America (o pequeno polegar da América), como é carinhosamente chamado pela população, também quer, há quase 20 anos, virar páginas de dor. Mas punir os criminosos, rechaçar a impunidade e manter viva a memória nem sempre foi – e muitas vezes não é – entendida como a prova séria dessa disposição. O país continua ignorando-se e sendo ignorado. Setores da sociedade, aqueles envolvidos com massacres, esquadrões da morte e desaparecimentos, querem incentivar o esquecimento em lugar da toma de consciência critica e isso faz com que, como nação, o lugar se mantenha olvidado.

Em nível latino-americano essa invisibilidade e desmemoria é igualmente latente. Brasileiros, particularmente, também tendem a conhecer mais da simbólica história de My Lay do que sobre os fenômenos e dores, com semelhança de caráter e motivações, que nosso continente sofreu. Não temos a menor idéia do que foi o El Mozote. A América Central toda, e quase sempre, não é vista no senso-comum mais do que como um pedaço de terra entre o sul e o império onde houve guerras, há vulcões e terremotos e nem nos envergonhamos dessa grotesca e absurdamente rasa idéia que temos da nossa própria geografia e história.

PARA CHEGAR AO EL MOZOTE

Sem veiculo próprio - como acontece em muitos destinos de El Salvador - o acesso não é muito simples, embora as estradas hoje em dia sejam bastante razoáveis. A falta de um sistema de transporte público decente no país (tema central de recentes acordos de cooperação entre Brasil e El Salvador) faz com que a viagem seja uma jornada.


Saímos no início da tarde do deprimente Terminal do Oriente de San Salvador com destino à cidade de San Miguel, de onde se toma outro ônibus. Ao chegar aí, pouco depois das cinco horas, já não há transporte até a famosa Perquin, (cidadela que foi o centro do controle guerrilheiro na região nos anos 80), com exceção das populares traseiras de camionetes em uma viagem de duas horas até outro lugarejo histórico, Francisco Gotera, para dai pegar outra pick-up. Para evitar estar na estrada ao anoitecer, decidimos passar a noite em San Miguel para seguir às seis da manhã seguinte.

No outro dia, depois de mais três horas de outro precário ônibus, chegamos ao lugar onde esta o Museu da Revolução Salvadorenha, um pequeno e humilde prédio, organizado pelos próprios ex-combatentes que ainda vivem na região, que abriga um verdadeiro arquivo histórico: armas usadas na guerra, cartazes do Frente Farabundo Martí Liberación Nacional (FMLN) e de organizações internacionais em solidariedade à ex – guerrilha, fotos de homens e mulheres que lutaram na revolução, cascos de bombas de 500 libras do arsenal norte-americano que eram despejadas pelo exército de El Salvador (financiado pelos Estados Unidos na sua política de contra-insurgência e intervencionista) e até os carros utilizados por dois dos cinco comandantes do FMLN durante a guerra, Schafik Handal e Joaquin VillaLobos.

Visitamos o museu pela manhã com a idéia de ir ao El Mozote pela tarde, mas depois das 13h já não há nem pick-ups que passem pelo desvio de Arambala, de onde temos que tomar outro ônibus para, por fim, chegar ao cenário do massacre. Assim, foi apenas na manhã seguinte que conseguimos chegar. Uma minúscula vila, entrada nas montanhas da parte Norte-oriental do país, quase na fronteira com Honduras. Hoje, o vilarejo não deve ser muito diferente do El Mozote do inicio dos anos 80, a não ser pela presença de um monumento a memória do massacre e pelo simpático e singular “posto de informação turística” em frente à igreja.

Alguns minutos depois de descermos do ônibus – com mochilas e caras de turista – no meio da silenciosa e polvorenta vila, uma jovem se aproxima disposta a nos contar a historia. Ao redor, só se vê uma dúzia de residências; a igreja; o passo eventual de uma criança ou adolescente de bicicleta; dois ou três homens, depois da cerca, com lenha ou apetrechos de trabalho agrícola nas costas; alguns cachorros famintos perambulando; um poço pintado de branco de onde se ergue um alto bambu com uma bandeira vermelha do FMLN no topo, e uma pequena mercearia de onde nos observa uma curiosa senhora.

Estamos em frente a diminuta praça onde está o monumento à memória do massacre e que guarda os restos mortais de um milhar de pessoas assassinadas. É ali, em frente aquela placa de metal recortada na forma da silhueta de uma família, colocada em frente a um muro de tijolos com os nomes das vitimas, que ouvimos a humilde guia turística do El Mozote relatar a triste historia da miserável vila e recorrer os lugares exatos das execuções, dos escombros das casas que resistiram aos incêndios provocados pelos soldados para esconder a vergonha da barbárie ali cometida.

VERGONHA ESCONDIDA

Durante 11 anos uma mulher, Rufina Amaya Marquez, foi diante de todo o mundo a única testemunha do massacre, mas pouca gente lhe dava crédito. Ela foi a única pessoa que, milagrosa e bravamente, sobreviveu a asquerosa operação “Yunque y Martillo” do famigerado Batalhão Atlacatl do exército salvadorenho no dia 11 de dezembro de 1981, quando foi executada toda a população de El Mozote e arredores.

Até outubro de 1992, ano em que a guerra civil de pelo menos 12 anos em El Salvador por fim havia terminado, Washington teve sucesso em manter o crime em segredo; enterrado entre mais de mil cadáveres no extremo oriente do país.

Rufina, que viu seu marido e quatro filhos (um deles de oito meses de idade que lhe foi arrancado do peito) serem assassinados, conseguiu, com uma extraordinária forca psicológica, contar a história ao mundo. Seu relato, verificado in locu por jornalistas norte-americanos, foi manchete do The Washington Post e do The New York Times após a legendária Radio Venceremos (órgão oficial de comunicação da guerrilha) ter denunciado o massacre. Porém a Casa Branca, que naquele momento, começo de 1982, debatia se manteria ou não mais apoio para o governo ditatorial salvadorenho combater a guerrilha, precisava desacreditar a história que, no período intrincado da Guerra Fria, deixava o país entre o dilema de manter a “segurança nacional” e o suposto respeito aos direitos humanos (já que os políticos americanos estavam cientes do nível de violência em El Salvador) que os Estados Unidos julgavam, e julgam, exercer.

“SECAR O RIO”

No dia primeiro de dezembro de 1981 a guerrilha foi informada de que havia sido confirmado um operativo militar de grande envergadura na região. O governo salvadorenho queria “resgatar” Morazan das mãos dos guerrilheiros que tinham o controle político no Oriente do país. Os oficiais temiam que se a guerrilha não fosse retirada de Morazan, o país, o menor de todo o continente Americano, com apenas 21 mil km quadrados, pudesse terminar dividido em dois.

O batalhão Atlacatl, treinado pelo carismático e truculento coronel Domingos Monterrosa (homem de confiança dos norte-americanos) era uma classe diferente da maioria dos soldados salvadorenhos. Eram mais ferozes, mais profissionais e muito melhor equipados. Sempre com dinheiro e estrutura norte-americana. Nesse período os EUA haviam dado um passo em frente no financiamento da guerra (que totalizou 500 milhões de dólares, oficialmente, entregues ao governo salvadorenho para combater a guerrilha), mas não estavam dispostos a envolver seus soldados diretamente, já que o país ainda estava sob a ressaca histórica do Vietnam.

O El Mozote estava dentro da zona controlada pela guerrilha, mas os rebeldes não eram capazes de oferecer aos civis suficiente proteção. Em uma operação do exercito de grande porte a população civil também tinha que fugir. Mas a população do El Mozote, no inicio daquele dezembro, decidiu ficar.

A MALDIÇÃO

Como em muitas outras comunidades do Departamento de Morazan, a população se esforçava em manter-se neutra durante a guerra e muitas vezes, de fato, tinha medo da guerrilha. Contudo, a confiança no exército, e em Marcos Diaz, contribuiu para levar todo o vilarejo à morte.

Segundo o livro “Vagalumes no El Mozote” (tradução livre do espanhol) publicado em El Salvador pelo Museu da Palavra e da Imagem (MUPI) com relatos da história feitos por Santiago, responsável pela legendária Radio Venceremos (Carlos Henrique Consalvi, atual diretor do MUPI), pelo jornalista norte-americano Mark Danner e pela própria Rufina Amaya, o dono da única mercearia da comunidade organizou uma plenária em frente a sua casa no início de dezembro de 81. Ele contou aos moradores o que lhe haviam dito em San Miguel, onde ele fazia as comprar para abastecer sua lojinha.

Um oficial do exército lhe garantiu que, apesar da operação militar estar realmente dirigindo-se ao El Mozote, o melhor a fazer era ficar na vila e permanecer nas casas para não correr o risco de que os soldados os confundissem com guerrilheiros em retirada. Marcos Diaz confiou na sua fonte no exército e a população do El Mozote confiou em Marcos Diaz.

A maioria ficou na vila, sabendo que o exército se aproximava, mas confiantes de que, por não serem colaboradores da guerrilha, nada de mal lhes ocorreria. A certeza converteu-se em decepção e morte e para Marcos Diaz, em uma maldição. O batalhão Atlacatl estava ali para levar a cabo uma estratégia política. civil organizada. A inédita e histórica vitória eleitoral no ano passado do FMLN, o ex-grupo guerrilheiro transformado em partido institucional depois dos Acordos de Paz de 92, tem gerado expectativas positivas em diversas organizações de direitos humanos e atores políticos do país, inclusive na comunidade internacional, para a plena realização dos direitos das vitimas por justiça e reparação nesse episódio do El Mozote e em diversos outros casos de violação dos direitos humanos durante a guerra civil no age:PT-BR">Oficialmente, a missão era aniquilar a Radio Venceremos. A rádio da guerrilha era a obsessão do coronel Monterrosa que não admitia e se enfurecia com a sua existência. O Atlacatl foi ao norte de Morazan, com destino a Guacamaya, onde de fato foi um dos lugares de funcionamento da emissora. Porem a inteligência da guerrilha já havia tomado conhecimento do operativo e o coletivo da rádio partiu do acampamento muito antes da chegada do exército. Durante seu trajeto a Guacamaya, o Atlacatl aterrorizou e assassinou em Perquin, em Torilas e no El Mozote finalizou sua missão de barbárie.

“Vagalumes no El Mozote” relata que o batalhão levou dois dias para cumprir o se pode chamar de ritual. A população foi dividida entre homens, mulheres e crianças; cada grupo encerrado em uma casa da comunidade. Os homens, que estavam na igreja, foram os primeiros. Foram levados em pequenos grupos atrás do prédio e metralhados e os que ficavam agonizando eram decapitados. As cabeças, cujos crânios foram encontrados anos mais tarde, foram amontoadas perto da sacristia. Pouco depois foi a vez das mulheres. Os soldados selecionavam as mais jovens e as arrastavam para os cerros nos arredores. As outras ouviam os gritos das que estavam sendo estupradas. Depois, os soldados voltaram às casas e começaram a separar as mães dos filhos. Grupos de mulheres eram levados a execução na pequena praça da vila e a casa aos poucos se enchia de órfãos aos prantos. Os soldados do Atlacatl por fim terminaram sua missão, matando todas as crianças do El Mozote.

Rufina Amaya assistia todo o repugnante ritual escondida atrás de um pé de maçã, que ainda existe no El Mozote reconstruído. Quando enfileiravam as mulheres na praça, ela, que estava ao final de um dos grupos, aproveitou a distração do soldado em meio ao alarido de desespero e se arrastou por baixo de uma cerca escondendo-se atrás da arvore onde permaneceu por todo um dia e toda uma noite. Ela faleceu em 2007, mas deixou registrado no livro publicado pelo MUPI o seguinte depoimento:

“Yo no sabía qué hacer. Estaban matando a mis hijos. Sabía que se regresaba allá me harían pedazos, pero no podía resistir escuchar los gritos de mis hijos. No podía soportarlo. Tenía miedo de llorar ruidosamente. Pensé que iba a gritar, que me iba a volver loca. No podía soportarlo y suplicaba a Dios que me ayudara. Le prometí que si él me ayudaba, yo le contaría al mundo lo que había ocurrido aquí. Después me amarre el cabello y la falda entre las piernas y me arrastre sobre el estomago detrás del árbol. Allí había animales. Unas vacas y un perro me vieron e yo tuve miedo de que hicieran algún ruido, pero Dios hizo que estuvieran silenciosos. Me arrastre entre ellos. Cruce la calle bajo un cero de púas y cruce entre las plantas de maguey hacia el otro lado. Me arrastre lejos a través de las espinas. Cavé un pequeño hoyo con mis manos y coloque mi cara dentro de él para poder llorar sin que nadie me oyera. Todavía podía oír los niños gritando y llorando. Me quedé allí con la cara en la tierra y lloré”.


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Durante as negociações para a paz em El Salvador, já no começo dos anos 90, foi estabelecido que seria criada, com intermediação da ONU, uma comissão internacional, chamada Comissão da Verdade, para investigar e fazer público os acontecimentos que marcaram a historia país e apontar recomendações. O documento define a guerra civil salvadorenha como “loucura” e “delirante”.

Assim como no Brasil pós-ditadura, a luta por memória, verdade e justiça em El Salvador têm sido conduzida pela sociedade civil organizada. A inédita e histórica vitória eleitoral no ano passado do FMLN, o ex-grupo guerrilheiro transformado em partido institucional depois dos Acordos de Paz de 92, tem gerado expectativas positivas em diversas organizações de direitos humanos e atores políticos do país, inclusive na comunidade internacional, para a plena realização dos direitos das vitimas por justiça e reparação nesse episódio do El Mozote e em diversos outros casos de violação dos direitos humanos durante a guerra civil no país que deixou um saldo de pelo menos 70 mil mortes.

Entretanto, permanece como o grande desafio da democracia salvadorenha e da plena reconciliação nacional – analogicamente ao desafio brasileiro pós-regimes militares – a revisão da Lei de Anistia. Ela é uma norma ainda vigente que estabelece a extinção penal de todos os que estiveram envolvidos na violação dos direitos humanos durante o conflito salvadorenho. Na prática, a possibilidade das vitimas exigirem justiça com base na informação do relatório da Comissão da Verdade está vedada por esse obstáculo.

Ainda hoje, nenhuma investigação ampla foi levada a cabo no país pelo Estado, ninguém foi condenado em El Salvador e permanece a impunidade.


*Aleksander Aguilar é jornalista graduado, mestre em Estudos Internacionais pela Universitat de Barcelona e doutorando em Ciência Política pela UFPE.

Deputados 'céticos' vão monitorar Comissão da Verdade

Integrantes da Comissão de Direitos Humanos da Câmara montam subcomissão para pressionar por investigação efetiva das circunstâncias de crimes cometidos pela ditadura militar. Sem possibilidade de punição de assassinos e torturadores pela Comissão, deputados esperam que investigações tragam à luz o máximo de fatos possíveis.


Céticos em relação à capacidade da Comissão da Verdade sancionada pela presidenta Dilma Rousseff de investigar crimes cometidos pela ditadura militar, deputados da Comissão de Direitos Humanos da Câmara instalaram, nesta terça-feira (13), uma subcomissão para fazer o acompanhamento externo dos trabalhos.

Sem meias palavras, a presidenta da Comissão de Direitos Humanos, Manuela D'Ávila (PCdoB-RS), foi bastante clara sobre os propósitos do grupo. “O ponto nevrálgico que nós leva a criar esta subcomissão é estabelecer toda a pressão política possível para fazer a Comissão da Verdade, de fato, funcionar”, afirmou.

Para comandar a subcomissão, foi escolhida a deputada Luíza Erundina (PSB-SP), que foi contra a lei da Comissão da Verdade porque não haverá punição a assassinos e torturadores. “Nós queremos ser a ponte entre a sociedade e a Comissão da Verdade, ajudando-a a acumular forças para levar seu trabalho às últimas consequências”, disse.

A crítica das parlamentares à Comissão, criada pela Lei 12.528, de 18 de novembro, é conhecida e reverbera a opinião de parte considerável das instituições de defesa dos direitos humanos, em especial as que reúnem familiares das vítimas da ditadura.

Para este grupo, a lei aprovada foi a possível, não a desejada. “É um instrumento de caráter muito restrito. São apenas sete membros para investigar 42 anos de história em um país deste tamanho, sem recursos suficientes para tal”, afirmou Erundina.

A deputada acredita que a subcomissão, ao contrário, terá mais liberdade e estrutura logística para trabalhar. Oito deputados participarão como membros, mas aspectos como orçamento, número de servidores auxiliares, dentre outros, ainda não foram discutidas.

A deputada aposta que, se conquistar apoio popular, a subcomissão poderá se transformar no instrumento político capaz, por exemplo, de rever a Lei de Anistia, perpetuada após ter sido julgada constitucional pela Supremo Tribunal Federal (STF) e de cobrar do governo a abertura total e imediata dos arquivos da ditadura que, conforme decreto assinado em pela presidenta, permanecerão em sigilo por mais 25 anos.

Com um otimismo contagiante, Erundina propõe como foco inicial dos trabalhos a Operação Condor, articulação entre governos dos Estados Unidos e da América do Sul para perseguir e eliminar ativistas de esquerdas, considerada uma das mais sangrentas ações de terrorismo de Estado já registrada na história, e na qual o Brasil teve papel decisivo. “Contaremos também com a experiência dos países vizinhos, em especial da Argentina, que é uma espécie de modelo para nós”, explicou.

Cooperação internacional
O deputado argentino Juan Cabandié, que participou do ato de instalação, relatou a experiência de seu país que, não só vem investigando a história dos chamados anos de chumbo, como punindo rigorosamente os culpados. “Já condenamos cerca de 800 agentes da ditadura e ainda temos de 600 a 800 por condenar”, relata.

Cabandié, que é filho de uma ativista política desaparecida durante o regime, foi roubado de sua mãe com apenas 20 dias de vida, quando ela estava em uma prisão clandestina, e criado pela família de um militar.

“Os brasileiros têm que construir um relato sobre o que foi o período da ditadura. Precisam contar às novas gerações que o objetivo principal das ditaduras na latinoamericano era o poder econômico. E que, por isso, milhares de pessoas morreram, desapareceram e foram torturadas no continente”.

Para o ativista político Jair Krischke, o Brasil vive uma transição democrática há muitos anos, que parece não terminar nunca. “Nós só podemos pensar em uma democracia consolidada, se toda essa questão for esclarecida. Temos que chegar ao final, e isso só será possível conhecendo a verdade”.

Fiapo de esperança
Autor de livros considerados referências sobre o tema, o jornalista Luiz Cláudio Cunha se diz bastante descrente em relação ao trabalho que será desenvolvido pela Comissão Nacional da Verdade, aprovada pelo Congresso, sancionada pela presidenta e que, agora, aguarda designação dos setes membros que irão compô-la.

“A instalação desta subcomissão nos dá um fiapo de esperança de que a Comissão Nacional possa funcionar. Nós passamos 16 anos com dois presidentes com origem na esquerda, Luiz Inácio Lula da Silva e Fernando Henrique Cardoso, sem que nenhum deles fizesse um movimento sequer para elucidar o que houve na ditadura. Agora que temos uma presidenta mulher, ex-torturada, ex-guerrilheira, o primeiro movimento parece já sair enfraquecido”, afirmou.

Na opinião do jornalista, a Comissão da Verdade possui poderes muito restritos para apurar a verdade, e nenhum para punir os culpados. Conforme ele, os demais países da América Latina já instalaram suas comissões há muitos anos, punindo culpados e promovendo a justiça social. “A nossa será instalada só no ano que vem para investigar 43 anos em dois anos, com recurso capengas. Se não houver pressão da sociedade e da imprensa mais consciente, nada vai acontecer”, acrescentou.

[Najla Passos - Carta Maior]

segunda-feira, 12 de dezembro de 2011

Mídia censura livro sobre "A privataria tucana"

Por Eduardo Guimarães

Neste fim de semana, chega ao público um livro que, apesar de jamais ter sido sequer mencionado em um grande jornal ou em qualquer outro grande meio de comunicação, era aguardado por dezenas de milhares de internautas que dele souberam através da blogosfera e de uma única revista semanal, a CartaCapital.

O livro recém-lançado pelo jornalista Amaury Ribeiro Jr., acusado no ano passado pela grande mídia de integrar complô para montar dossiê contra José Serra, pode não conter apenas acusações sem provas ou meros xingamentos. Segundo o autor, apresenta provas de roubo de dinheiro público no processo que o jornalista Elio Gaspari batizou como “privataria”.

É revelador como o livro A privataria tucana jamais recebeu um único comentário inclusive do autor do termo que resume o que foi o processo de privatização de empresas públicas durante o governo Fernando Henrique Cardoso, ou seja, um dos maiores saques sofrido pela nação em toda a sua história e que superou até a roubalheira da ditadura militar.

A imprensa que vive se dizendo “independente”, portanto, ao tentar esconder o livro “proibido” está dando a ele a maior contribuição que poderia.

Mídia partidária

Explico: se fosse uma obra fraca, com denúncias fracas, seria excelente alvo para veículos partidarizados como Globo, Veja, Estadão e Folha. Se a escondem, é porque seu conteúdo deve ser arrasador. E como quem se interessa por assuntos assim certamente tem acesso à internet e a blogs políticos, a censura aumentará o interesse.

Os grandes meios de comunicação fazerem de conta que não viram o livro, portanto, talvez seja tão importante quanto seu conteúdo, pois pessoas bem-intencionadas que têm dúvidas sobre o partidarismo político daqueles meios agora dispõem de prova incontestável desse partidarismo.

Ora, imprensa que se diz “independente”, se fosse mesmo não precisaria concordar com um livro considerado bombástico para noticiar seu lançamento ou para produzir análises de seu conteúdo. O lançamento da obra é um fato político saboroso para qualquer jornalista de verdade. Aliás, é escandaloso que o autor do termo “privataria” tenha se calado.

Este blogueiro ainda não leu o livro, o que começará a fazer no fim de semana. Até aqui, portanto, não sabe se as denúncias são fundamentadas. Pelo tratamento que a obra está recebendo da mídia, é possível concluir que deve ter muito mais do que suposições e xingamentos.

Se assim for, a mera publicação da obra não desnudará tão-somente o partidarismo de uma máfia que se autoproclama “imprensa independente”; permitirá que os setores pensantes e decentes da sociedade descubram se o Brasil tem Poder Judiciário ou se são todos comparsas dos poderosos chefões midiáticos.

sábado, 10 de dezembro de 2011

10 de dezembro: Dia dos Direitos Humanos

COMISSÃO DA VERDADE E OMISSÃO DO ESTADO

Por Renato Della Vechia

Recentemente foi criada pelo Congresso a Comissão da Verdade. Seu objetivo é investigar e tornar público os crimes cometidos pelo Estado contra cidadãos desde 1945 até o final do período militar. Aparentemente uma medida importante e que teria como finalidade esclarecer os crimes (os chamados excessos) cometidos pelo Estado brasileiro.

Apesar de alguns ainda considerarem que a tortura e assassinatos aplicados pelo Estado foi necessário no “combate ao comunismo”, cabe lembrar que uma das principais funções do Estado é a segurança dos cidadãos, mesmo daqueles que estão sendo punidos e sob guarda das instituições públicas. Podemos até aceitar que indivíduos ajam a partir de motivações pessoais (racionais ou não), no entanto, sob hipótese alguma poderíamos conceber que o comportamento das instituições públicas se dê a partir das mesmas motivações. Portanto, se um indivíduo que age por vingança pode ser, em certas circunstâncias, até mesmo perdoado pelo Estado, o mesmo não vale para instituições que tem um conjunto de códigos de conduta e leis a seguir.

Por si só, toda forma de tortura é degradante para quem a executa. Desde o assédio moral até os espancamentos que ainda hoje acontecem em delegacias de polícia em nosso país. Mas que dizer de fatos como o esquartejamento e desaparecimento do corpo do ex-deputado federal David Capistrano? Ou dos corpos dos militantes do PC do B no Araguaia que foram queimados em uma enorme vala com pneus e gasolina derramada em cima? Ou ainda do jornalista Mário Alves, empalado vivo com um pedaço de madeira cheio de estrias de aço e que morreu de hemorragia, sangrando sem parar durante algumas horas e sem atendimento na delegacia de polícia em que estava? E inúmeras outras histórias de estupro e assassinatos, sem falar da utilização de cobras e jacarés utilizados para amedrontar presos políticos, ou de baratas introduzidas em vaginas e ânus dos detidos. Ou dos instrumentos como a Coroa de Cristo, pontiaguda com pontas de aço e um torniquete, a qual era colocada sob a cabeça dos presos e o torniquete era apertado até que as pontas de aço perfurassem o cérebro. Apenas “excessos”?

O que alguns chamam de “combate ao terrorismo” na verdade foi um verdadeiro “circo dos horrores”, onde tudo era permitido pelos governantes de então e acobertado pela grande mídia.
Claro que a repressão não ocorreu apenas no Brasil, mas sim em diversos países da América do Sul. O que é exclusivo de nosso país não é a repressão em si, mas sim o fato de ser o único país a não punir ninguém pelos crimes cometidos.

Aqueles que não querem a punição dos culpados frequentemente afirmam que houve “excesso” dos dois lados. É verdade que houve mortes ocasionadas por ações armadas da esquerda. No entanto não tem como colocar tudo no “mesmo saco”. Nem nos livros publicados pelos integrantes das forças repressivas existe uma única denúncia de tortura praticada por membros da esquerda. Em segundo lugar, quem optou pela luta armada estava lutando pela democracia e contra um regime autoritário. Não houvesse o golpe que acabou com a democracia no país, não haveria a resistência armada. Sem falar que a quantidade de mortes é incomparavelmente menor e que na maioria dos casos em que aconteceu seus responsáveis de alguma forma foram punidos com prisões, torturas e exílio.

A lei de anistia, que buscou “colocar uma pedra” no problema e isentar de responsabilidade os dois lados, na realidade foi apenas um mecanismo para impedir que no futuro os responsáveis fossem punidos, e é nesse sentido que defendemos que ela precisa ser revista.

Para os que acham que crimes foram cometidos dos dois lados, não há problema em organizarmos julgamentos de quem cometeu algum tipo de ação que resultou em mortes. Nesse caso analisaríamos o caso e as circunstâncias, o delito cometido, as possíveis penas que muitos já cumpriram e verificaríamos se estes ainda “devem” algo para a justiça.

Da mesma forma, colocaríamos no banco dos réus todos aqueles que executaram tortura e assassinatos, bem como todos os que mandaram e os que foram coniventes e tentaram acobertar os fatos. Dessa forma, sim, teríamos construído justiça em nosso país, e não com uma comissão que não tem poderes, é limitada em sua estrutura e não tem foco em suas investigações.

terça-feira, 6 de dezembro de 2011

Direitos Humanos e Políticas de Memória

No Dia dos Direitos Humanos, a capital gaúcha sedia mais uma atividade
realizada pelo Arquivo Público

Desde 2009, no Dia dos Direitos Humanos (10/12), o Arquivo Público de Porto Alegre, promotor do evento, junto com a Escola do Legislativo da Assembleia Legislativa/RS e o Departamento de História/UFRGS organiza debates sobre o tema.

Neste ano, a proposta é sobre "Direitos Humanos e Políticas de Memória".

Mais informações abaixo, no banner digital:

quinta-feira, 1 de dezembro de 2011

MÃOS AO ALTO! É um assalto o aumento das passagens dos ônibus!

Ato público contra o aumento da passagem do transporte acontece hoje,
com a organização do Fórum de Lutas Sociais


Mais uma vez, a Prefeitura de Pelotas e os empresários do transporte coletivo saqueiam o bolso do trabalhador, na calada da noite!
Ônibus velhos, cheios, sujos e atrasados fazem parte do dia-a-dia do povo de Pelotas.
Os empresários só querem o lucro, e a Prefeitura, que deveria fiscalizar o transporte público e obrigar as empresas a cumprirem a lei, não faz a sua parte e ainda presenteia os patrões com mais um aumento. Sem contar que todos os cálculos feitos para justificar o aumento são mantidos em sigilo e o povo só fica sabendo quando tudo está resolvido, pois o Conselho Municipal de Transportes não funciona em nosso município.

Contra este abuso, precisamos dar o troco! Só o povo mobilizado pode responder a este ataque!


ATO CONTRA O AUMENTO DAS PASSAGENS DE ÔNIBUS

DIA 1º DE DEZEMBRO (QUINTA-FEIRA) ÀS 17 HORAS, NO CHAFARIZ DO CALÇADÃO
COMPAREÇA!